
Contada do fim para o começo, Diários de Otsoga é sobre estar em pleno auge do isolamento social, provocado pela pandemia, quando se tinha apenas a urgência de viver ao presente. Filmado entre agosto e setembro de 2020, em uma chácara portuguesa afastada da urbanização, a equipe responsável pela produção do longa, dirigido em mão dupla por Maureen Fazendeiro e Miguel Gomes, se prepara para montar esse filme que não tinha roteiro, trama ou personagens, porém tinha muita vontade de voltar a fazer Cinema.
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O filme Diários de Otsoga começa de um jeito e termina de outro. Se antes estávamos apenas acompanhando o cotidiano do trio Crista Alfaiate, Carloto Cotta e João Nunes Monteiro que decidem construir juntos um borboletário, o filme pacientemente vai resgatando outros integrantes presentes nesta casa que serve como refúgio da realidade que está a quilômetros de distância. É conforme a narrativa acompanha o calendário regredindo que o roteiro de Fazendeiro e Gomes, escrito ao lado de Mariana Ricardo vai mostrando a sua real intenção. Mérito disso se deve a montagem de Pedro Filipe Marques que descontrói uma linearidade costumeira para nos propor a experiência de relembrar como a jornada íntima de fazer cinema começou. É quase quando refletimos sobre este recente passado que passamos diante de incertezas, de inseguranças e de fragilidades causadas pela crise pandêmica, em que facilmente nos perdemos na noção do tempo e do que foi a realidade na época.

A partir daí, Diários de Otsoga trilha por uma complexidade instigante em que não sabemos definir quando as pessoas em cena estão atuando ou sendo elas próprias diante das câmeras ou à espera de alguma direção dos diretores ou se estão refletindo sobre seus personagens. Isso torna o longa de Maureen e Miguel contemplativo ao mesmo tempo desafiador pela expectativa de montar o quebra-cabeça provocado pelo calendário andando para trás e, com isso, compreender, instantaneamente, as discussões em cena. Seja o esboço de uma ficção nunca concluída ou o documento dos bastidores. Contudo, é preciso também ressaltar o quanto o filme compartilha as suas frustrações, sendo possível se identificar com as banalidades passadas pelo isolamento social e esta urgência de sair disso.
Diários de Otsoga é um filme sobre a pandemia e a experiência que foi passar por este período exaustivo, sem precisar enfatizar as obviedades. Está ali. Documentada por pessoas que, assim como o mundo todo, só queria voltar a dançar. A estreia ocorre no dia 21 de julho nos cinemas brasileiros.