
Casos criminais sempre atraíram público independente do seu formato no audiovisual. Seja como série ou longa-metragem, o gênero ganha fãs a todo instante. No cinema nacional, este estilo não é tão recorrente em comparação com o cinema estadunidense, mas se for pegar pela ótica televisa, programas como Linha Direta – que costumava reproduzir de forma ficcional casos reais que aconteciam em vários cantos do Brasil – ou até mesmo outros como Cidade Alerta – que acompanha, em muitas vezes em tempo real, situações do dia a dia que envolvam a criminalidade – mostram o interesse peculiar do povo por uma tragédia.
Dirigido por Maurício Eça, os filmes A Menina Que Matou os Pais e O Menino Que Matou os Meus Pais nasceram ambiciosos. Trazer à tona um dos casos mais midiáticos do início do século 21, que foi o assassinato do casal Manfred e Marísia von Richthofen, orquestrado pela filha deles, Suzane, dividido em duas partes pareceu ser uma boa estratégia para aproveitar o material oriundo deste crime. Afinal, os dois cúmplices do homicídio deram versões completamente opostas e simplesmente jogaram a culpa um no outro na hora do aperto. No entanto, o resultado dessa grande produção é tão superficial quanto a peruca usada pela Carla Díaz na cena do julgamento.
Mas calma, os filmes não são de todo mal como está sendo descascado por aí. Como qualquer narrativa, ele segue uma linearidade dos fatos, tem uma linha de raciocínio e entrega a proposta de apresentar as duas versões dos acusados. Porém, após assistir aos dois longas você sai com absolutamente nada de novo deste caso. Nem uma informação, uma reflexão, um outro olhar. Nada. E aí chega a seguinte questão: então, por que fazer estes filmes? Ao ficar apenas na superficialidade, o projeto perde a oportunidade de instigar uma provocação ou um debate por medo de se posicionar e limitação criativa. A justificativa de deixar para o público ter a sua própria opinião sobre os filmes é tão redundante porque nós já temos uma opinião sobre os envolvidos do crime há quase 20 anos e nada mudou desde então.
Por isso A Menina Que Matou os Pais e O Menino Que Matou os Meus Pais parecem mais dois episódios especiais do finado Linha Direta, por exemplo, já que o objetivo do programa era exatamente apenas retratar de forma ficcional o que se sabia das respectivas histórias e nada mais além disso.
A Menina Que Matou os Pais talvez seja o mais interessante entre os dois filmes, já que é uma versão que a maioria compra até hoje, por caracterizar Suzane como a “vilã” e mandante de fato do crime, enquanto que O Menino Que Matou os Meus Pais é tão delirante por nos mostrar a jovem tão inofensiva e completamente submissa por amor ao ex-namorado Daniel Cravinhos que é impossível de acreditar em um segundo do que é dito ali. Tudo bem, eu ainda vou passar pano por causa da fidelidade do roteiro com os processos do caso. Mas em nenhum dos filmes, a atuação dos personagens, especialmente de Carla Díaz e Leonardo Bittencourt, é decepcionante, apesar de ambos sofrerem com as limitações e caricaturas impostas. Então não há muito do que se fazer e muito menos sentir com este projeto de filme duplo.
Existem outros filmes brasileiros que conseguem ir mais a fundo de casos criminais que podem servir de referência para quem tem interesse no gênero, como a minissérie documental Elize Matsunaga: Era Uma Vez um Crime, disponível na Netflix, os filmes A Última Parada 174 (ficção) – disponível no Telecine – e Ônibus 174 (documentário) – disponível na Globoplay -, VIPs, disponível no YouTube Filmes, o curta-metragem Quem Matou Eloá – disponível na plataforma Filme Filme – e Carandiru: O Filme, disponível na Globoplay.
A Menina Que Matou os Pais e O Menino Que Matou os Meus Pais estão disponíveis na Prime Vídeo.