O curta-metragem Nossos passos seguirão os seus… do cineasta Uilton Oliveira estará presente no 62° Festival Internacional de Cine de Cartagena de Índias (FCCI). O evento ocorre entre 22 e 27 de março na Colômbia.

Na obra, Oliveira revisita Domingos Passos, um operário anarquista que liderou e sumiu em meio às revoltas na Primeira República (1989-1930). Ele viveu seu auge no Rio de Janeiro, mas não se sabe a data e como morreu. Não existem depoimentos, nem gravações, nem árvore genealógica, nem condecorações sobre o protagonista.

Já Oliveira foi despertado para reimaginar Domingos nos autores dos círculos anarquistas os quais frequenta, coletando jornais no trabalho e na Biblioteca Nacional. Foi então que a produtora executiva Gabriela Holz, da produtora Corpo Fechado, captou o estímulo para recriar os passos de Domingos com a seleção do projeto no Lab Curta da FUNARJ 2021.

Ao longo dos 13 minutos do filme, é possível trazer a imaginação para o real por meio de resquícios, como os jornais com prenúncios de uma greve geral liderada por Domingos, devido ao “desaparecimento” do proletário Antonio Silva após ser preso pela polícia em 1920. Nos sons, narrações radiofônicas de textos escritos por este líder ainda desconhecido se misturam com a performance impecável do ator Alessandro Conceição, e imagens de revoltas do presente, em especial as menções às chacinas do Costa Barros (2015) e Jacarezinho (2021), e o assassinato do congolês Moïse (2022).

A caminho do Oscar?

O Festival de Cartagena, o mais antigo do continente, é credenciado pela Federação Internacional de Associações de Produtores Cinematográficos (FIAPF) e qualifica curtas-metragens para o Oscar. A recepção para produções negras, como Nossos passos seguirão os seus… é uma sinalização do mercado a fim de dialogar com o mundo e o seu próprio país, que realiza o Festival Internacional de Cine y Video Afro Kunta Kinte em Medellín.

Cartagena também busca revisitar o passado por ter sido um dos principais portos escravocratas.

Nas ruas de arquitetura secular circulam vendedoras de quitutes com tecidos coloridos oriundas do Palenque de San Basilio a 50 km da urbis, o primeiro território negro livre das Américas em 1713, formado por africanos e seus descendentes. Um cenário não muito diferente do que viveu Oliveira em Salvador, na Bahia, cidade em que nasceu e lhe deu régua e compasso.

Faz-se assim a bagagem do diretor e da equipe, que conta com nomes como Camila de Moraes, Janaina ReFem e Hugo Anikulapo Lima, reconhecida com a estreia mundial no Festival Brésil en Mouvement em Paris, a menção honrosa no 11° Mumbai Shorts International Film Festival na Índia, e o prêmio Canal Brasil de Curtas no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.