
O diretor e roteirista Hugo Anikulapo Lima apresentou, nessa quinta-feira, o curta-metragem No Caminho de Casa na 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes (MG). O filme está disponível para assistir gratuitamente no site do festival enquanto durar o evento. Assista aqui.
Nos 10 minutos de filme, Hugo Lima consegue a fixação dos sentidos no espectador em torno do diálogo entre um pai, Marcus Hamasien (Cachalote Mattos), e um dos filhos, Cassius (Gabriel Gentil), dentro de um carro em uma viagem para a casa do mais velho, o “vô”. A cada instante a narrativa consegue traduzir o que pretende o diretor nas suas falas: “Quais as estratégias que criamos para dizer que amamos?”.

O automóvel, fixado como símbolo de poder no imaginário da masculinidade, se torna um ambiente de intimidade a fim de sintetizar outra linguagem a qual homens negros almejam ou já vivenciam. Nos diálogos é possível adentrar em um amor o qual a violência é substituída por cuidado e afeto ao escutar e reclamar do mais novo, e ao ajudar o mais velho.
No retrovisor, os dois, guiados por um fio de contas de Oxóssi, estão a decidir o itinerário da viagem quando o pai se atenta para um alerta do filho, e diz: “Nós, não sabemos de tudo. E nunca se sabe demais. Mas é preciso estar sempre perto de pessoas que nos façam ser melhor.” O tempo o qual os diálogos e os cortes se dão estão em harmonia com o tempo ancestral do “vô”, e também nas influências cinematográficas de Hugo: André Novais, Idrissa Ouédraogo e Abderrahmane Sissako.
Série de curtas da Siyanda

A trajetória de Hugo está intimamente ligada ao Coletivo Siyanda – Cinema Experimental do Negro, berço de nomes como Alessandro Conceição, Algrin David, Carol Netto, Cachalote Mattos, Davidson Candanda, Nathali de Deus, Pan Nogueira, Patrícia Rodrigues e Uilton Oliveira. Como profissional na assistência de câmera e fotografia, agora ele almeja ainda mais reconhecimento junto com o coletivo carioca a fim de fazer mais filmes.
No Caminho de Casa, em especial, se inicia no curta Siyanda (2016); é quando aparece Marcus, o pai, um dos personagens embalados por um canto para Nanã no acolhimento às dores de uma mulher negra no centro do Rio de Janeiro.
Já em Senhor de toda cruz (2018), Cassius, o filho, é um jovem negro correndo pela cidade sob a guarda de Exu. Nesses dois, Hugo já demonstra maturidade ao traduzir o fluir da câmera e dos corpos pretos na cena. Até que em Fim de tarde (2019) ele mergulha nos diálogos e na intimidade do pai e do filho dentro de casa. As obras foram eitas em um país que o racismo corroeu a democracia e encontrou o fascismo, quando as políticas de fomento começavam a reconhecer a produção audiovisual negra.
As três obras podem ser assistidas no canal do YouTube da Siyanda.