Blade Runner 2049 é um ótimo exemplo de como reviver um clássico do cinema e dar uma continuidade digna e respeitosa. O filme dirigido por Denis Villeneuve estreia nesta quinta-feira resgatando toda a nostalgia dos fãs do cult Blade Runner, lançado lá em 1982, e trazendo uma nova aventura desta vez com Ryan Gosling caçando replicantes que ameaçam, novamente, a humanidade que está em completo caos. Após a falência da Corporação Tyrell, a empresa de Niander Wallece (Jared Leto) é a responsável pela criação de uma nova série mais obediente de androides, como é o caso do policial K (Gosling), o que torna os modelos antigos um alvo para serem “aposentados” da sociedade. Entretanto, em uma das suas missões, K descobre um perigoso segredo que pode causar uma revolução entre estes androides sentimentalistas. O que logo desperta mais uma caça ao único especialista no assunto: ninguém menos que Rick Deckard (Harrison Ford).
O longa possui a receita perfeita para o sucesso de uma sequência que demorou 35 anos para retornar às telas. E talvez seja um dos fatos que beneficiam produções como esta, alguns bons anos separando a obra original de seu pupilo. Como podemos conferir também com o bom T2 Transpotting. Outro ponto principal é ter seu primeiro realizador, Ridley Scott que assina a produção executiva, entre os integrantes da equipe. Digo isso, pois tudo que você assistiu no primeiro filme, segue fielmente nesta continuação: o futuro sombrio e cada vez mais pessimista, os cenários sujos e superpopulosos, questionamentos filosóficos sobre a vida, o afeto entre dois seres superficiais, enfim, referências que se tornam frescas com a narrativa lenta que Villeneuve também adotou no filme. Até mesmo o suspense com toques noir em meio as investigações demonstram que o tempero continua o mesmo, só a execução do prato que ganhou um novo chefe. Só que como Blade Runner de 1982, sua longa duração deixa a jornada, muitas vezes, cansativa para finalmente chegar aonde nos interessa.
O diretor Denis Villeneuve soube aproveitar vários elementos para renovar não só a estética, mas também o conteúdo da história que explora mais sobre a implantação de memórias e deixa mais pontas soltas para o público amarrar. Outro item positivo e muito importante no filme é a sua grande diversidade visível na distribuição dos personagens, inclusive entre as mulheres do longa. Não existe apenas a mocinha que é interesse amoroso do protagonista, que é o caso de Joi (Ana de Armas), que representa, espiritualmente, a companheira de K durante a trama, mas tem até a intimidadora Luv (Sylvia Hoeks), lutando de igual para igual com o protagonista e sendo a opositora perfeita do “mocinho”. E para completar o time feminino, a chefe Lieutenant Joshi (Robin Wright) que se mostra tão inteligente e forte como qualquer outro homem em seu posto, mas com o respeito que poucos conseguem impor. Estas pequenas conquistas podem passar despercebidas, mas são representatividades como estas que dão um novo gás ao cinema. Principalmente quando se quer caminhar para um futuro diferente e inovador como é o caso desta história. Viu como é fácil a inclusão feminina em vários papéis, Hollywood?
Depois do queridinho La La Land: Cantando Estações, Ryan Gosling é o melancólico e contido agente K. Diferente do primeiro filme, aqui o protagonista sabe da sua posição de replicante. Claro que com o seu rostinho influencia a nossa simpatia com o personagem, mas ele demonstra perfeitamente como toda pessoa, seja um replicante ou não, está sempre em busca de algo real para sua vida. Nem que seja preciso, literalmente, pagar por estes prazeres. O trabalho do ator é satisfatória, mas nada de surpreendente. O asqueroso Esquadrão Suicida quebrou a imagem que eu tinha de Jared Leto e seus trabalhos sempre tão inesquecíveis e respeitáveis. Mas aqui, finalmente fiz as pazes com Leto que volta com uma atuação precisa. Ele é o novo pai destes androides que procura a perfeição entre seus “anjos”. Leto aparece pouco, mas o suficiente para provar a sua veia maligna e artística. E como em Star Wars VII: O Despertar da Força, Harrison Ford é o que todos esperam para vê-lo novamente em cena como o policial Deckard. Assisti-lo, mais uma vez, em um papel que marcou sua carreira tem um gosto especial e faz valer a pena para quem o esperou por todos estes anos. Especialmente para descobrir o que realmente aconteceu entre Deckard e Rachael (Sean Young)? Será que ele vai revelar se é um replicante ou não? Como ele sobreviveu? Será que ele fez mais um filho por aí? Blade Runner pode não ter sido tão valorizado na sua época de lançamento, mas todos estes anos apenas lhe fizeram bem culturalmente. O que comprova que o tempo é o melhor remédio para um filme. Blade Runner 2049 o agradece.
• Texto escrito originalmente para o site Correio do Povo
Blade Runner 2049 | Direção: Denis Villeneuve | Roteiro: Hampton Fancher e Michael Green | Elenco: Ryan Gosling, Dave Bautista, Jared Leto, Harrison Ford, Robin Wright, Ana de Armas, Wood Harris, Sylvia Hoeks, Mackenzie Davis e Barkhad Abdi | Gênero: Sci-Fi | Nacionalidade: Estados Unidos, Inglaterra e Canadá | Duração: 2h43min