Quando Feud: Bette and Joan foi anunciado como uma série que retrataria os bastidores do filme O Que Terá Acontecido A Baby Jane? (1962), em que estrelavam Bette Davis e Joan Crawford, duas atrizes que se odiavam profundamente, eu estava esperando uma série de comédia. Já que pelo teor dos trailers com uma trilha cômica e mostrando cenas um tanto hilárias, achei que a série mostraria esta rivalidade de forma mais leve. Mas não! A série me surpreendeu e muito ao dar um olhar mais dramático e respeitoso a história de Bette e Joan. Afinal, a gente não percebe como estamos acostumados a colocar uma mulher contra outra só para ver faíscas de brigas e como isto rende um entretenimento barato para os outros. Uma coisa é você simplesmente não simpatizar com outra pessoa e isto é normal, e está tudo bem isto acontecer. Agora, promover uma eterna batalha de egos só para render público e dinheiro para Hollywood, aí é muita baixaria.
Na série, Bette (Susan Sarandon) e Joan (Jessica Lange) já estão afastadas da mídia por um bom tempo. Tem a questão da idade. Ambas estão velhas e para Hollywood, elas já não são consideradas atrativas para um filme. Também, naquela época de 1960, o cinema ainda era o grande painel onde os artistas mais importantes estavam em cartazes. A televisão era um lugar para os sem talentos. Por isso, era raro quando algum ator ou atriz migrarem para produções na TV. Bette e Joan foram as rainhas do cinema nos anos 1930, 40 e 50. Uma era extremamente talentosa e ganhadora de dois Oscars. A outra foi considerada a atriz mais linda de todos os tempos e era desejada para estar nas telas por causa disso. O que faltava em uma, tinha na outra. E as duas sempre se odiavam por causa desta comparação, que os outros faziam, e que infelizmente não poderiam corresponder. Cansada de não obter mais trabalho, Joan Crawford foi atrás de um roteiro em que poderia estrelar conforme a sua idade permitia. Encontrou o livro O Que Terá Acontecido A Baby Jane? e não poderia ter sido a melhor história para ela e sua rival, Bette Davis, terem a sua volta aos cinemas. Mas não foi fácil conseguir convencer Bette e nem do então diretor do filme, Robert Adrich (Alfred Molina) a entrarem no projeto devido ao risco de ter duas mulheres velhas em um longa com um tema tão macabro. Mas quem viu uma oportunidade foi o produtor Jack Warner (Stanley Tucci) em lucrar em cima da famosa rivalidade das atrizes e provocar ainda mais brigas entre as duas para atrair público para ver o resultado final deste embate.
Idealizado pelos produtores Jaffe Cohen, Michael Zan e Ryan Murphy – o mesmo de American Crime Story: The People vs O.J. Simpson – Feud exibe duas histórias sobre dor, ser mulher e solidão. É muito interessante como a série proporcionou que víssemos como a indústria cinematográfica é ingrata com suas estrelas e principalmente como quem sofre e continuam sofrendo são sempre as mulheres. Por se tratar de um meio machista e sexista, Hollywood era muito severa com atrizes mais velhas ao colocarem elas para fora do jogo quando muito já foram responsáveis pelo sucesso de um filme e também por marcarem história no cinema. E também por sempre a submeterem a papéis insignificantes ou convencionais como a mãe louca, a avó morrendo ou uma bruxa má e etc, além de que Hollywood não apostava também em mulheres assumindo a direção de um filme ou um cargo mais importante em um set de filmagem. Tudo isso influenciou para que Bette e Joan fossem as maiores vítimas deste preconceito todo. A série se mostrou extremamente importante em exibir casos particulares das atrizes e dos demais coadjuvantes para que fosse compreendido esta dor que é ser mulher em um meio tão competitivo e dominado pelos homens. O que não difere de nenhum outro lugar do mundo. Se for abrir o olho em volta, a situação pode se repetir sem que seja em um set de filmagem ou em uma cerimônia do Oscar. As mulheres estão sempre tendo que dar o dobro para ter o mesmo reconhecimento que um homem. E a idade continua beneficiando ainda só os homens, já perceberam isso?
Outro detalhe belíssimo que Feud produz é abordar mais o lado de Joan Crwaford do que de Bette Davis como forma dar uma nova chance para esta estrela tão ofuscada por todos de contar a sua história. Se você começa achando que ela é muito mimimi, depois percebe que ela foi a mais abandonada por todos. A série abre espaço para que finalmente Joan possa ser celebrada e respeitada como todas as atrizes da época de ouro de Hollywood. Jessica Lange, responsável por Joan, é uma reencarnação daquele glamour todo da época. Sem contar que tanto ela quanto Susan Sarandon conseguiram ao mesmo tempo darem o seu perfil para os personagens e ficarem idênticas a Bette e Joan. Porém, Susan consegue nos espantar ainda mais com sua performance e ao se fantasiar de Baby Jane, você percebe que Bette Davis está ali, na alma da atriz. Mamacita (Jackie Hoffman) é a personagem mais carismática e feminista da série toda! Ela é responsável pelo discurso empoderado apontando estatísticas de que a população feminina estava aumentando na época nos Estados Unidos e que com isso um novo público seria formado para o cinema. Logo, seria preciso que mais filmes com e para mulheres fossem produzidos no futuro. E não é que ela estava com a razão? Mamacita é a mulher mais forte, inteligente e sensível de Feud e que se mostrou muito necessário para que não só Joan colocasse os pés nos chão, mas também para nós que assistíamos.
Feud: Bette and Joan é uma série feminina muito importante. Porque como apontei antes, a série fala muito do universo da mulher e como é difícil segurar vários papéis que a vida nos coloca. Assim como é difícil ver as chances diminuindo conforme a sua idade vai aumentando. Bette e Joan poderiam ter tido uma vida muito menos dolorosa e solitária se o mundo não fosse machista. Mas como Mamacita previu, o mundo ainda será todo nosso.
[…] – The People v. O. J. Simpson: American Crime Story, The Assassination of Gianni Versace e Feud: Bette & Joan são suas melhores produções – e ele acerta, mais uma vez, em Halston, por ser curta e […]
CurtirCurtir
[…] o cenário undeground de Nova Iorque e humaniza a comunidade LGBT dos anos 1980, e até mesmo, Feud: Bette and Joan, onde o produtor selou a paz – novamente imaginária – entre duas grandes rivais de […]
CurtirCurtir