“Eu jurei mentiras e sigo sozinho”, esta é a frase de Sangue Latino de Secos e Molhados que abre a série Magnífica 70. Eu sei que o seriado do momento é Narcos e todo o talento de Wagner Moura é compartilhado a todo momento nas suas linhas do tempo, mas sou do contra e este carinha vai ficar para o próximo final de semana. Nessa última quis me dedicar apenas a esta série de Claudio Torres e Carolina Jabor que é ambientada, contada e maravilhosamente muito bem mostrada nos anos 70 de São Paulo. Estamos em plena época da ditadura militar no Brasil e, este é o principal vilão da história e o fundamental para que existam tantas mentiras nesta teia.
Ninguém está ali por amor ao cinema. Este sentimento só vai surgir depois que o bichinho da sétima arte os pegar de vez. Assim como fala George, personagem de Stepan Nercessian: “depois que te contar tudo, você não poderá sair”. A frase é direcionada a Manolo (Adriano Garib), um caminhoneiro que larga a estrada para se tornar um produtor na empresa Magnífica Cinematográfica localizada na região da Boca do Lixo, onde existiam milhares de produções da pornochanchada. Claro, há uma história por trás disso e não, não vou entregar assim tão fácil. Como a empresa é de fachada para que o dono da produtora, o George, possa pegar uns trocos e dividir com Manolo, eles precisam que os filmes passem pela censura para que cheguem até as salas de cinema. Aí é que entra Vicente (Marcos Winter), um censor que tem como função assistir os últimos lançamentos e decidir se veta ou não um filme. Em uma das suas sessões, ele assiste A Devassa da Estudante, um filme que irá lhe perturbar profundamente. Tudo porque a protagonista Dora Dumar (Simone Spoladore) lhe lembra sua falecida cunhada que continua presente no seu imaginário e o de sua esposa Isabel (Maria Luisa Mendonça). Ufa, hein? E olha que isto nem foi o começo.
As histórias paralelas são, de grosso modo falando, os “rabos presos” destes quatro personagens. Seus flashbacks são tudo o que mais aguardamos para sabermos os motivo de agirem de tal maneira. Tal recurso é usada de forma irritante em alguns casos, como nas memórias de Vicente que não consegue esquecer a sua cunhada. Sim, ele tem as suas razões, mas chega em um momento em que queria dizer EU JÁ ENTENDI, CHEGA! PORÉM, se você pensar por outro aspecto, é como se estivéssemos em sua mente e aquelas imagens o perturbassem a todo instante e é isso que a série quer que você sinta e carregue este peso que ele tem. O personagem de Marcos Winter é o que você vai mais amar odiar. Ele praticamente vive os dois mundos (
oi Hannah Montana) da época: o da expressão e a repreensão da arte. Se em casa e no trabalho, ele é o cara automático que segue um roteiro sem qualquer tipo de emoção, na Magnífica, toda esta representação se rompe quando consegue se libertar e colocar pra fora seus sentimentos, vontades e tudo aquilo que aprendeu com os filmes que assistiu na sua cabine particular. E nos dois casos, ele tem tanto que omitir quanto mentir sobre a sua vida. Ele vai ser o personagem mais dúbio da trama. Você não sabe se torce pra que ele se dê bem ou que apanhe de uma vez.
Sua esposa, a Isabel, é quem mais se transforma no decorrer da história. A primeira vista, parece que ela também é outra apática, uma dona de casa robótica que vive apenas para o marido. Porém nas viagens do tempo, conhecemos que Isabel é uma mulher à frente do seu tempo, odeia a sua família e casou (apesar dos pesares) para fugir de casa. Mas nem por isso, conseguiu essa ~tal liberdade. E se no presente ela é quieta e conformada com a sua vida, quando percebe que está sendo deixada de lado, ela logo se rebela e vai experimentar os anos 70. Infelizmente, tudo acaba mal pra ela, que tinha tudo pra ser uma heroína. Dora é a personagem que é quase um clichê, mas que não tem motivos para não ama-la. Eu fui enganada por ela, pois realmente achei que era a única que queria ser estrela de cinema. Mas que nada. Dora é uma vigarista tão profissional que atuar faz parte da sua genética. A sua reviravolta no final da temporada me alegrou bastante, ainda mais por achar que a sua parceria com Manolo, talvez, seja a única coisa verdadeira ali dentro daquela produtora.
Magnífica 70 reúne o que o cinema tem de melhor e do pior. Há todos os itens para se fazer um filme: a equipe com o ator exagerado e convencido, o assistente de produção que cuida dos podres dos outros, o fotógrafo irritado, os investidores que gostam de opinar em tudo e o próprio produtor (Manolo maravilhoso) que tem que gerenciar tudo e, o pior de tudo, é que ele gosta. A série também é uma aula de história devido a ditadura militar como pano de fundo e que relata como boa parte das coisas funcionam na época. Digo boa parte, pois né, o mais forte na trama é apenas o carimbo de proibido na papelada. A trama, os personagens e estas “teias” que vão se desmanchando são o que tornam Magnífica 70 mais uma série para gente adicionar na lista de mais aguardadas para a próxima temporada.
Criado por: Claudio Torres, Renato Fagundes e Leandro Asssis
Direção: Claudio Torres e Carolina Jabor
Elenco: Marcos Winter, Simone Spoladore, Adriano Garib, Maria Luisa Mendonça
Nacionalidade: Brasil
Gênero: Drama
Produção: HBO Brasil